quarta-feira, 13 de maio de 2015

ADVOGADO(S) ACOMPANHANDO PERÍCIAS

Tema recorrente que demanda mais debate, pois ainda não foi pacificado. Inicio meu modesto ponto de vista pessoal destacando o plural "advogados" do título. Sim, a presença do advogado do autor assegura o direito de presença do advogado do Reclamado, já que ambas as partes têm os mesmos direitos processuais. Neste cenário vivenciaríamos debates entre interesses diversos dentro de um, em geral pequeno, consultório médico. O documento final deixaria de ser um Laudo e passaria a ser uma Ata, já que construído sob muitas autorias ou influências. O absurdo da cena nos chama à razão regressando a uma reflexão preliminar sobre o que significa Perícia Médica e sua inserção nos universos tanto da Medicina quanto do Direito.

A relação médico-paciente [1] existe mesmo em ambiente pericial, situação onde a medicina está sendo chamada a auxiliar o Juízo, o que não pode ser feito sob violação de seus princípios (da medicina). Medicina é o exercício de uma relação humana de confidencialidade e privacidade. É na privacidade do consultório que se revelam as fraquezas, as contradições, os temores do ser humano sendo vedado ao médico expô-lo publicamente; muito mais do que a nudez. Se em uma consulta assistencial o paciente prefere ficar nu, cabe ao médico o dever de pedir para cobrir-se, expondo apenas o necessário à sua avaliação. Se numa perícia o periciando expõe questões que não interessam à Perícia, cabe ao perito exercer sua habilidade e trabalhar no interesse do Juízo preservando o indivíduo em sua dignidade. Assim, creio que nem a vontade do paciente, aqui periciando, deva prevalecer sempre, cabendo ao médico a condução de seu trabalho nos limites éticos.

É certo que alguém que ingresse em Juízo esteja disposto a ter sua privacidade debatida, mas o médico deve ser guardião dos limites, para isto tem formação Médica. Em um consultório, não pode haver presença de pessoas estranhas ao universo médico pois, além do exposto, não estaríamos acrescendo nada que venha a contribuir efetivamente para a elucidação dos fatos. Teríamos uma ou mais presenças constrangedoras, inibidoras sobre a livre manifestação do periciando, presenças não comprometidas necessariamente com o que busca o perito, mas com o que seja do interesse do cliente ou da parte oposta.

A perícia médica envolve a observância das expressões faciais, posturas, respostas a manobras médicas, sendo sempre desejável que não haja nada a reforçar ou inibir condutas de um lado e rações de outro; pois disto depende a conclusão segura e verdadeira que auxiliará o Juízo.  É equivocado atribuir a perícia a classificação como ato judicial, como argumentam advogados [2]; não é, a perícia médica é ato médico cuja conclusão é auxiliar e nem mesmo vinculativa do Juízo.

Alegam os advogados direitos conferidos pelo Estatuto do Advogado da OAB, Art. 7o [3]. inciso I, III, IV, letra “c” e “d” do EAOAB, Lei n. 8.906/94”. Já o CFM, através de uma de suas seccionais, o CREMESP, se manifestou que o médico em função de perito não deve aceitar qualquer tipo de constrangimento, coação, pressão, imposição ou restrição que possam influir no desempenho de sua atividade que deve ser realizada com absoluta isenção, imparcialidade e autonomia, podendo recusar-se a prosseguir no exame e fazendo constar no Laudo o motivo de sua decisão [4].

Como seria o caso de o perito contábil fazer suas contas com o advogado, ou advogados das partes sentados ao seu lado? E em uma cena de crime onde os peritos colhem provas? 

A Lei do Ato Médico, 12.842/2013 [5], estabelece que a REALIZAÇÃO da perícia é ato privativo do médico. In literis: Art. 4o São atividades privativas do médico: (...) XII - realização de perícia médica e exames médico-legais,(...)

O Advogado de qualquer das partes tem garantido o acesso à perícia, entendida aqui como Laudo médico-legal; mas não tem direito a acesso à perícia, entendida agora como ato médico, característica inarredável no interesse da Justiça e da Sociedade. Ao ato médico pericial é garantido às partes se fazerem acompanhar ou representar por assistentes técnicos médicos, o que assegura o direito ao contraditório e à verificação da lisura da perícia com propriedade de quem também detém conhecimento médico. 

Eduardo Henrique Almeida é perito previdenciário, perito judicial, integra a Câmara Técnica de Perícias Médicas do CRMMG, especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas pela AMB e professor de Perícias Previdenciárias da Fundação UNIMED.

_______________________________
[1] http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/618
[2] http://admin.oabpr.org.br/imagens/downloads/526.pdf
[3] Art. 7º São direitos do advogado:
c) em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado;
d) em qualquer assembleia ou reunião de que participe ou possa participar o seu cliente, ou perante a qual este deva comparecer, desde que munido de poderes especiais.
[4]http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/crmsp/resolucoes/2005/126_2005.htm
[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12842.htm

5 comentários:

mirela disse...

Poderia a nossa associação enviar um representante a este seminário? Na medida que está sendo discutido a presença do advogado da parte junto a pericia judicial, entendo que ate esta agora está sendo alvo de desconfiança(independe os motivos). Já participei como perita da instituição deste mesmo curso em outra ocasião, situação em que os discursos só eram feitos contra nós. Agora me parece que a desconfiança é geral. Talvez seja o momento ideal para que nossa liderança atual deflagre uma ação que nos retire da Instituição, algo no modelo da PEC 325/09. Se toda a pericia oficial se unisse em busca da independência, a possibilidade de ser ouvida seria maior. As duvidas que acometem a independência da pericia são as as mesmas embora em situações diferentes.

mirela disse...

Poderia a nossa associação enviar um representante a este seminário? Na medida que está sendo discutido a presença do advogado da parte junto a pericia judicial, entendo que ate esta agora está sendo alvo de desconfiança(independe os motivos). Já participei como perita da instituição deste mesmo curso em outra ocasião, situação em que os discursos só eram feitos contra nós. Agora me parece que a desconfiança é geral. Talvez seja o momento ideal para que nossa liderança atual deflagre uma ação que nos retire da Instituição, algo no modelo da PEC 325/09. Se toda a pericia oficial se unisse em busca da independência, a possibilidade de ser ouvida seria maior. As duvidas que acometem a independência da pericia são as as mesmas embora em situações diferentes.

Cavalcante disse...

Brilhante reflexão do EH.
Apenas acrescento que a previsão legal de indicação de assistente técnico, já existente nos Códigos Processuais (CPC e CPP), garante tecnicamente a ampla defesa e o contraditório às partes, não justificando a presença do Operador do Direito, durante o ato médico pericial que tem caráter eminentemente técnico científico.

Unknown disse...

Mesmo que os segurados neguem e tbem neguem os advogados, estes comparecem à perícia para coordenar o que o requerente deve ou não informar ao médico. Na prática o que se verifica é o requerente, a cada pergunta nossa, se virar para o acompanhante (que o está instruindo) e pedir, ainda que com os olhos, se deve ou não responder aos nossos questionamento. Ora, trabalhamos tentando descobrir o que é verdade em todo o relato do requerente, que por vezes inventa histórias mirabolantes. Se, além de tudo isso tivermos pessoas que "pedem" ajuda ao advogado durante a perícia e com isso passamos a ser ainda menos informados da situação real do segurado, não se onde vamos parar; penso que a interação deva ocorrer única e exclusivamente entre perito e periciado. Os advogados atrelam o seu desempenho, como figuras consoladoras para o requerente, e quase chegam a nos convencer de que realmente estão preocupados com a vida do segurado, mas cobram por isso, têm interesse financeiro neste acompanhamento que fazem.

Eduardo Henrique Almeida disse...

A oportuna sugestão do Dr Cavalcante foi incorporada ao texto. Obrigado.