Segurados do INSS vão e voltam aos postos de atendimento sem resolução
No silêncio rompido apenas pelo apitar das senhas, milhares de brasileiros, em todo o país, alimentam diariamente a frustração de perceber a incapacidade do Estado em atendê-los
CORREIO BRAZILIENSE
Publicação: 22/12/2013 07:50 Atualização: 22/12/2013 15:05
No Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) mesmo quando não há fila, há drama, revolta e espera, muita espera. Enquanto a senha que a pessoa tem em mãos não pisca no painel e traz um pouco de alívio, uns cochilam, outros tomam café da manhã atrasado. “Se você ficar aqui um minuto e for só um pouco emotivo, vai chorar”, avisa Antônio de Pádua Melo, 59 anos, funcionário da Caixa Econômica Federal que sofre de câncer de próstata, sem perder o senso crítico e, acima de tudo, o bom humor e a vontade de viver.
Sentado próximo ao balcão de atendimento, ele analisa, em voz alta, as repetidas cenas a que assiste. “Você está vendo alguém desejar bom-dia? Não tem nada disso. Eles devem pensar: ‘Lá vem mais um velho que não sabe de nada, um babaca, um otário para atrapalhar meu dia’”, dispara, enquanto aguarda a vez de ser chamado para a perícia médica. “É assim: eles, servidores públicos, fazem de conta que nos servem. A gente faz de conta que está tudo bem. E a vida segue”, resume o segurado, também um funcionário do Estado, com anos dedicados a uma empresa que, periodicamente, recebe dinheiro do Tesouro Nacional, ou seja, do contribuinte.
Reinaldo Freire da Silva na chegada em sua residência em Luziânia
No silêncio rompido apenas pelo apitar das senhas, milhares de brasileiros, em todo o país, alimentam diariamente a frustração de perceber a incapacidade do Estado em atendê-los, muitas vezes nos momentos mais difíceis da vida. “Não dá para culpar somente os funcionários. O que temos aqui é a ponta do iceberg, resultado de um sistema corrupto, de uma máquina administrativa completamente inoperante”, pondera o bancário Alex Pereira, 58, que há dois anos tenta resolver uma pendência com o INSS.
Geralmente é assim: os casos parecem simples de serem resolvidos, mas ninguém os resolve. À medida que se arrastam, ganham uma complexidade improvável. Alex torceu a perna e teve de ficar 26 dias afastado do trabalho. Acionado pela chefia, mesmo doente, acabou batendo ponto uma vez nesse período, o que bloqueou o benefício. Desde então, tenta receber o que lhe é de direito. O processo no INSS? Perderam na mudança de endereço da agência. “Decidi relaxar e tratar o serviço público como um mosteiro zen. Venho testar a paciência”, conta.
Modelo opressor
Se na resolução dos problemas faltam agilidade e eficiência, no quesito segurança o INSS é implacável. No posto da 502 Sul, quatro guardas armados monitoram com rigidez o acesso de idosos e deficientes, em sua maioria. “É o Estado opressor que quer inibir logo de cara. Estou achando é graça”, comenta o aposentado Walter Ribeiro, 68, cujo contador descobriu um débito de 2011, do qual ele pretende se livrar. “O desrespeito é constante. Mandam você pegar uma senha, esperar o tempo que for necessário para depois ouvir que está no lugar errado. Pedem, então, para ligar, agendar e voltar em dois meses. Nunca há uma solução”, relata, indignado.
A falta de rigor na transmissão da informação é o que mais intriga Reinaldo Freire da Silva, 39, o deficiente que, recém-operado, teve de peregrinar por três postos do INSS e, em cada um, recebeu uma orientação diferente. “Se soubesse que seria assim, tinha ficado me recuperando, como o médico mandou”, diz ele, que após pegar dois ônibus, desembarca às margens da BR-040 e caminha por mais 10 minutos até chegar em casa.
Reinaldo vai confiar na última informação oficial e retornar ao INSS em maio de 2014. “Imposto a gente tem que pagar no dia, sem atrasar. Mas, na hora de receber o benefício, é assim, uma enrolação só. Fazer o quê?”, comenta o segurado, que não consegue entender o porquê de tanto desencontro das orientações. “O governo deveria preparar melhor seus funcionários”, sugere.
O INSS atende cerca de 4 milhões de brasileiros por mês nas 1,5 mil agências do país. Por telefone, segundo o instituto, esse número salta para 6 milhões. Conforme o órgão, na última pesquisa de opinião, feita com 23 mil segurados pela central de atendimento, a avaliação foi positiva. O INSS informa, ainda, ser importante acompanhar as queixas, para corrigir distorções. E acrescenta que, a partir de 2006, as longas filas deram lugar ao agendamento eletrônico, elevando a qualidade do serviço prestado.
» Análise da notícia
Ineficiência e corrupção
O conformismo e a descrença de muitos de nós diante da precária qualidade dos serviços públicos não contribuem em nada para a mudança necessária. Os bate-bocas nos guichês e, infelizmente, as ligações para as ouvidorias, também não. A ineficiência dos órgãos públicos no Brasil tem uma raiz profunda, fortalecida por apadrinhamentos políticos, vaidades partidárias, corrupção em todos os níveis, despreparo e incompetência dos que se dizem gestores. Embora o discurso seja antigo e repetitivo, a revolução que os contribuintes esperam na máquina administrativa do país tem como ponto de partida o investimento em educação e cidadania. O devido reparo em visões distorcidas sobre o serviço público ajudaria, da mesma forma, a conter a frustração compartilhada entre Estado e sociedade. Enquanto jovens buscarem o funcionalismo apenas para saciarem desejos de estabilidade e altos salários, nossos impostos continuarão sem o retorno esperado.
Um comentário:
O Império da ineficiência...
Isso, na INSSanidade, nós peritos médicos conhecemos MUITO BEM !!!
Airton França Diniz Junior.
Postar um comentário