02/06/2013 - 12h06 - Atualizado em 07/06/2013 - 23h36
Injustiça social: eles sofrem sem se aposentar
Enquanto profissionais doentes recebem "não" do INSS ao requerer benefício, servidores públicos que burlam a lei obtêm gordos ganhos
MIKAELLA CAMPOS | mikaella.campos@redegazeta.com.br
Foto: Edson Chagas
“O perito judicial disse que não tenho capacidade, que só posso trabalhar se não ficar sentado ou em pé por muito tempo. Como vou dirigir deitado?”, diz Clementino. Num país onde um grupo seleto consegue, de maneira duvidosa ou às vezes injusta, se aposentar com um benefício de até R$ 26 mil, há uma grande parcela da população que luta para provar que está doente e precisa se aposentar. São trabalhadores, a maioria pobre, que vivem o dilema de não ter condições de cumprir suas atividades profissionais, porém têm o auxílio-doença ou mesmo o afastamento definitivo negado pelo INSS.
Sem renda, não têm condições sequer de comprar os remédios para continuar a sobreviver com dignidade. Mesmo tendo contribuído ao INSS, para eles, aposentar-se por invalidez ou mesmo receber o auxílio-doença é um martírio que pode demorar anos para terminar. Funcionária da iniciativa privada, essa gente precisa ir à Justiça ou passar por diversas perícias para comprovar à Previdência que está com enfermidades graves e incapacitantes. Regina Fernandes Amorim, por exemplo, está há três anos buscando um auxílio-doença: ela tem LER e doença degenerativa na coluna lombar. Há alguns meses foi demitida da empresa onde trabalhava por justa causa. A companhia alega abandono de emprego. O marido dela é o responsável por sustentar a casa sozinho e eles contam com a ajuda da igreja para conseguir remédios e alimentos. “Eu quero trabalhar, mas não consigo. Sinto dor o tempo todo. Essa situação é bem humilhante. Cheguei a ter depressão”.
Seu Clementino Toresani Ferreira, de 57 anos, sofreu um acidente de trabalho que agravou uma lesão na coluna: a dor o impede de ficar muito tempo em pé ou sentando. Há dois anos noticiamos em A GAZETA o drama do motorista para receber assistência do governo. A Previdência afirma que ele pode voltar ao emprego, mas a empresa não o libera para retornar ao serviço. Resultado: ele está sem renda. “Eu não queria me aposentar, pois a empresa onde trabalhava garantia benefícios que dobrava meu salário. Por que eu ia querer perder isso?”.
Foto: Edson Chagas
Seu Joaquim tem enfisema pulmonar e respira com ajuda de um cilindro de oxigênio. O padeiro Joaquim Ribeiro do Nascimento, de 71 anos, teve o auxílio-doença cancelado em 2010 e até agora está sem receber nada. A empresa não o aceita de volta e também não paga seu INSS. O resultado foi que ele perdeu a condição de segurado da Previdência. Agora, vive com ajuda de familiares. Depois que a enfisema pulmonar se agravou, não consegue sair de casa. “Eu só recebi três meses de benefício do INSS. Eu vivo de favor”.
Enquanto isso, num mundo à parte, é possível observar funcionários públicos que burlam a lei e ganham o direito de se aposentar por invalidez. O contraste fica mais forte quando servidores públicos condenados por atos de corrupção são premiados em vez de punidos. O castigo que recebem, pelas práticas criminosas, é uma gorda aposentadoria.
Veja a história de Joaquim Ribeiro:
Via-crúcis
Há três semanas, o programa “Fantástico”, da Rede Globo, mostrou o caso de concessão indevidas de aposentadoria e comparou com a história de dona Marisa Ferreira Sarto. Ela tenta há 11 anos se aposentar porque é cardiopata, tem sequelas de um AVC, bico de papagaio, hérnia de disco e câncer de mama. Na última semana, após passar por uma nova perícia, a segurada teve novamente a aposentadoria por invalidez negada.
O “Fantástico” descobriu que funcionários do Senado e da Câmara ganham mais que R$ 20 mil de aposentadoria por invalidez e levam uma vida normal, trabalhando em outros empregos. A prática é proibida por lei.
Foto: Vitor Jubini
Regina Fernandes, que tem LER e doença degenerativa, enfrenta calvário há 3 anos. Professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e especialista em Políticas Públicas, Roberto Garcia Simões analisa essa situação como o retrato de um Brasil que não garante os mesmos direitos a todos. Segundo ele, a frase “todos são iguais perante a lei” deveria ser assim: “para a lei, alguns são iguais”.
“O privilégio é destinado aos amigos. O rigor da lei é aplicado apenas aos inimigos. E é esse tipo de ação que mantém as desigualdades, não apenas econômicas e sociais, mas também legais. No caso da Previdência, o certo seria exigir de todos as mesmas regras, independente da colocação profissional e de sua atividade na sociedade”, diz.
Dificuldade
O advogado previdenciário Geraldo Benefício afirma que tem acompanhado diversos casos de trabalhadores com dificuldades para se aposentar por invalidez ou para conseguir o auxílio-doença. “A pessoa apresenta os laudos dos seus médicos, ressonâncias e assim mesmo o INSS nega o benefício”, diz. Os casos como esses vão parar na Justiça.
O coordenador-chefe do Serviço de Saúde do Trabalhador, Julius Caesar Ramalho, explica que o trabalhador precisa parar de ver o perito do INSS como mau ou bom. “Não existe excesso de zelo. O que acontece é que nem sempre o trabalhador, mesmo doente, está impedido de exercer sua função. Às vezes, o perito realmente erra. Porém, há muitos trabalhadores que querem se aposentar indevidamente”.
O perito médico judicial Ricardo Peres explica que uma das questões que alarga o conflito entre INSS e trabalhador seria equipar a perícia médica e também capacitar os médicos assistentes, responsáveis por cuidar da saúde do trabalhador. “Muitos profissionais dizem que o trabalhador deve se aposentar de forma equivocada”, ressalta.
Peso diferente
No Estado, magistrados acusados de irregularidades no exercício do cargo foram punidos com aposentadoria compulsória. Veja alguns casos:
Desembargador Frederico Pimentel
Foi aposentado com benefício de R$ 24.117,62.
João Miguel Filho
Foi aposentado com benefício de R$ 22.911,74.
Larissa Pignaton Sarcinelli Pimentel
Foi aposentada com 37 anos de idade e com renda mensal de R$ 7.252,19.
Silvio de Oliveira
Foi aposentado aos 53 anos com renda mensal de R$ 22.911,74.
Outro lado: INSS justifica decisões e negativas
Regina Fernandes Amorim
O INSS explica que a segurada recebeu benefício de auxílio-doença até 23/03/10. O benefício foi cessado porque o “perito médico não identificou incapacidade para o trabalho”. O chefe do Serviço do Trabalhador, Julius Caesar Ramalho, afirma que é necessário verificar se a trabalhadora tem doença ocupacional e também degenerativa em partes diferentes do corpo. Ele diz que a segurada pode requerer um novo benefício, caso haja algum fato novo relacionado à sua capacidade laboral, ou pode recorrer à via judicial. No entanto, Ramalho informa que a trabalhadora poderá agendar um atendimento, na segunda-feira, pelo telefone 135, que será providenciada a análise da situação dela por uma junta médica.
Joaquim Ribeiro do Nascimento
Segundo o INSS, seu Joaquim fez perícia dia 09/05/2013, e o médico perito reconheceu sua incapacidade e propôs sua aposentadoria por invalidez. O processo foi indeferido porque ele perdeu a qualidade de segurado, conforme a explicação a seguir:
“Não consta contribuição/recolhimento para a Previdência Social em nome do seu Joaquim desde junho de 2010. Ele teve um período de ‘graça’, garantido por lei, até 15/10/2011, quando perdeu a ‘qualidade’ de segurado”. Assim, embora o INSS reconheça sua incapacidade e proponha sua aposentadoria por invalidez, ele não é mais segurado da Previdência Social, e o benefício não pode ser concedido, a não ser que a empresa onde ele trabalhava faça os recolhimentos por meio de uma GFIP Retificadora. O indeferimento foi administrativo e não médico pericial (técnico). Outra possibilidade é se ele comprovar por meio de documentos (laudos/exames e outros) que está doente (com enfisema) antes de perder a qualidade de segurado, no período de "graça", ou seja antes de 16/10/2011. Esta informação foi dada por ele durante o exame pericial. Ele alega que “está doente desde 01/01/2011, mas não comprovou tal informação. É preciso provar, para respaldar a concessão do benefício.
Outra possibilidade é ele pedir a baixa da sua carteira de trabalho e informar ao INSS. Depois disso, se ele atender aos requisitos legais poderá fazer jus ao Benefício Assistencial (BPC/Loas)”. Porém, Ramalho orienta o trabalhador a comprovar pela carteira de trabalho o vínculo com a empresa e não a solicitar o Loas, que é bem menos vantajoso que uma aposentadoria. Como em 2010, seu Joaquim foi direcionado a voltar ao emprego e a empresa não o aceitou porque acreditava que ainda estava doente, o patrão deveria ter arcado com o pagamento dos salários dele até que ele voltasse a realizar uma nova perícia médica.
Clementino Toresani Ferreira
Seu Clementino, segundo o INSS, fez a última perícia há dois anos. Como o benefício foi negado, porque o perito não identificou incapacidade para o trabalho, ele entrou na Justiça. Se a Justiça decidir a favor dele, “o INSS irá cumprir”. Até o momento nenhuma notificação chegou nesse sentido. Sendo assim, ele pode requerer novo benefício, caso haja algum fato novo relacionado a sua capacidade laboral. Assim como no caso de Regina, seu Clementino poderá agendar uma nova perícia pelo 135 e será direcionado a uma junta médica para análise das suas condições de saúde.
Fonte: A GAZETA
Pela Dignidade do Brasil !!!
ResponderExcluirTodos os aposentados do serviço público, estatutários/efetivos, devem ter suas aposentadorias revisadas pelo SIASS (Junta Médica Federal do Servidor Público) urgentemente.
Um índice em torno de 50% dos servidores públicos aposentados por invalidez tem plenas condições de retornarem ao trabalho adaptados, isto é, aptos com leve adaptação para a função laboral de origem.
Por Lei, toda aposentadoria por invalidez, seje do RGPS/INSS ou de servidor público, deve ser revisada administrativamente pela administração pública de 2 em 2 anos, para verificação de eventual retorno da capacidade laborativa.
Mostra bem a enorme confusão que é a Perícia médica. Observe que uma jovem senhora quer se aposentar por LER. Certamente esta senhora poderia ser encaminhada para reabilitação profissional, mas a resistência é tão grande ao trabalho que não haverá sucesso. O DIRSAT poderia inclusive tentar reabilitá-la para sentir a "pressão".
ResponderExcluirUm motorista com 57 anos que ser aposentar por sequela de fratura de vertebral. A Primeira coisa é saber da sua habilitação para pilotar veículos. Um caso possível para reabilitação também porém o governo sempre foi negligente com a questão e prefere o assistencialismo.
E último caso um segurado com "apenas" 71 anos que se aposentar por invalidez, esse é o retrato do "social" que não chega na população por restrições legais.
Boa materia. Dessa vez pelo menos colocaram o lado do INSS. O caso deste senhor de 71 anos merece ser visto com mais cuidado. Um SIMA poderia esclarecer e fornecer subsidios para retroagir, se fosse o caso, ou nao. Posso estar redondamente enganado, mas eu DUVIDO que isso tenha sido feito. O que vejo na pratica eh que eh mais comodo indeferir, ja que o governo nao valoriza o trabalho cuidadoso e nao valoriza o servidor publico. Acredito que isso aconteca com todo o funcionalismo publico, ate mesmo com juizes, pelo que ja conversei. Por exemplo, diante do volume de denuncias, nao tem como ler todas antes de aceitar e acabam entao ou aceitando sem ler ou lendo por alto. Pra quem esta olhando de longe, fica impossivel de compreender porque um caso desses pode tomar tanto tempo de uma pericia.
ResponderExcluirCompanheiro é 20 minutos pra se virar! E SIMA é encaixe! Se liga!
ResponderExcluirE o sr de 71 se tivesse pago ja taria aposentado!
Fernando me desculpa,
ResponderExcluirMas tenho certeza que não há a menor necessidade de revisar todas as aposentadorias por invalidez, salvo por imposição da lei.
Eu sou contra a revisão de 2 em 2 anos, acho que o tempo de retorno deve ser estimado para o perito inclusive com a opção de desnecessidade.
Negar isso é negar o controle ainda que parcial sobre a irreversibilidade de algumas morbidades e gerar insegurança jurídica e administrativa.
Se a perícia medica, digo o governo, já que é da sua responsabilidade, conseguisse recursos logísticos para fazer a revisão de segurados, ou seja, cumprir a lei, deveria fazer em casos selecionados por sugestões, denuncias e triagem epidemiologica.
Bastaria dar conta de cruzar dados de Imposto de Renda, CNIS e documentos oficiais outros. A receita federal pode resolver facilmente, inclusive sem necessidade do INSS.