Lançado ontem com o polêmico subtítulo: "Como acabaram as filas nas portas das agências", o livro de feitura da Dataprev conta basicamente a história da informatização do INSS com a evolução dos sistemas corporativos, da tecnologia de informação da autarquia que levou aos programas de melhorias de gestão que permitiram ao INSS a partir de 2006 começar a tratar boa parte da demanda por vias remotas, a saber: Telefone 135, Internet e sistemas internos de processamentos de dados.
O livro entrevista diversos gestores do presente e do passado recente que participaram desse processo de mudança e destaca o contraste entre o antes e o depois, citando exemplos claros sobre as filas nas portas das APS antes e após 2006, em especial APS já sabidamente problemáticas e sobrecarregadas. O texto foca os servidores da carreira do seguro social e supervaloriza conquistas do âmbito do fluxo de gestões e sistemas.
É chocante ler que em nome da agilidade e da eficiência priorizou-se a informatização sem os devidos critérios de segurança legal preconizados em lei e regulados pelos protocolos da ICP-Brasil, como se a exigência de formação de processos administrativos fosse coisa do "passado".
Isso é hoje em dia a principal causa dos problemas de atendimento do INSS. Essa facilidade gerou a explosão de requerimentos a partir de 2006, o que combinado com uma guerra interna declarada contra a perícia médica (cujos motivos já foram dissecados em postagens prévias) resultou numa explosão de demanda e uma queda da capacidade de atendimento médico, que é a gênese do colapso previdenciário em andamento no Sul.
Os gestores erraram ao avaliar que o aumento da demanda foi pelo "desrepresamento" de quem não conseguia ser atendido nas APS. Não, os números mostram que o contínuo aumento da demanda segue a taxa de crescimento de cobertura previdenciária e teve sua explosão facilitada na época pela ausência da necessidade de se ter a documentação em dia para agendar um serviço. Ocorre então no INSS o mesmo que ocorre nos planos de saúde: de 20 a 30% de faltas sem aviso prévio e os que comparecem, a maioria em situação irregular. Muitos marcam e simplesmente esquecem ou marcam de impulso e na hora faltam por não ter a mínima documentação.
É esclarecedor ver que a parte onde diz que o agendamento de perícia médica pela internet foi um "avanço" foi relatada pelo atual diretor da DIRBEN. É a prova cabal de que a DIRBEN é incompetente para gerir os processos de auxílio-doença, por incapacidade técnica dos gestores em compreender o processo de administração na área da saúde na qual o auxílio-deonça está inserido. Esse agendamento online sem controle é a gênese dos problemas atuais envolvendo a gestão do auxílio-doença. Típico caso onde mais significa menos.
Nenhuma palavra é dada aos peritos médicos, que só são citados en passant quando se fala das gratificações, mas uma importante passagem nas páginas 14-20 mostra a perícia quando a terceirização das perícias médicas foi explicitamente citada pelos gestores como uma das causas dos problemas das filas e da corrupção no INSS.
Agora que a justiça determinou a volta da terceirização em uma equivocada e polêmica decisão do TRF-4, é mais que fundamental a todos os gestores lerem o livro antes de se empolgarem a novamente contratar peritos particulares para periciar segurados em seus próprios consultórios.
Algumas falhas contidas no livro precisam ser corrigidas ou esclarecidas:
a) O sistema de reconhecimento automático não funciona de fato - Até 80% dos requerimentos dos segurados apresentam pendências a ser corrigidas no dia da perícia médica.
b) O SABI não é um sistema próprio da Dataprev. Foi contratado via firma terceirizada na época de Ornellàs no MPS e depois "incorporado à força" à Dataprev, que até hoje tem dificuldades em lidar com ele. O SABI é instável, inseguro, falho e trava a feitura de um laudo médico de qualidade.
c) A possibilidade de agendamento de perícias médicas de forma direta pela internet foi um dos maiores erros do INSS e é a gênese do atual problema de filas. Ao permitir que uma quantidade fixa de agendas fosse disponibilizada nacionalmente para marcação sem nenhuma filtragem circunscricional (quem é do Acre pode agendar em Porto Alegre), sem identificação prévia do cidadão (o que permite que não-filiados agendem e ocupem indevidamente vagas) e sem fazer o processo capeado legal exigido em lei (o que permite agendamentos fraudulentos, incompletos ou com graves erros documentais) o INSS entregou para a população a discricionariedade de decidir quem e onde será agendado, superlotando as agendas e deixando o INSS refém de fatores externos ao qual não pode controlar. É um caso único de benefício que começa do "meio" para depois checar o "início".
d) O SGA é altamente manipulável pois suas variáveis dependem da concessão de senhas que são controladas pelo gestor da APS. Na maioria das vezes seus números não são reais e ao atrelar a gratificação dos administrativos a esse monitoramento acabou institucionalizando a maquiagem dos números através de táticas fáceis de manipulação de emissão e baixa de senhas. O SGA perdeu sua função de monitor e virou um número fictício.
e) A central 135 já foi amplamente denunciada aqui por graves erros operacionais, reportagem da TV Globo ao lado do Presidente do INSS mostrou a operadora instruindo um segurado a cometer fraude contra o INSS e dando falsas informações sobre os fluxos da autarquia. Os textos que vem escritos do canal da ouvidoria são de dar dó. Em alguns casos não se compreende o que se lê.
f) O atendimento remoto deixou a autarquia vulnerável pois ao invés de ser usada apenas para agilizar fluxos e com isso acelerar o tempo presencial do segurado na APS, em muitos casos se propõe a substituir plenamente o servidor como na marcação de perícia sem prévio agendamento do benefício para análise de direito e nas queixas contra servidores. Por virem sem a assinatura do depoente ou coletadas a termo, essas queixas são imprestáveis e não servem sequer para um processo administrativo, pois a CF 88 exige a devida identificação do denunciante.
g) A toda hora os sistemas CNIS e SABI caem deixando milhares de APS sem poder operar. Seu modo centralizado facilita essa vulnerabilidade. Não há semana que não ocorra isso. Tanto que por isso a Dataprev já foi apelidada nas APS de "Dataperde".
h) A lentidão no avanço dos sistemas é prejudicial ao INSS. Há 5 anos o SIBE já é prometido e entramos em 2013 com ele ainda em testes e operando com falhas graves.
i) Uma autarquia que se propõe a ter soluções de TI para agilizar seus fluxos tem que ter um eficiente e forte sistema de proteção contra invasores cibernéticos. Mas o INSS é um dos locais mais frágeis para ser invadido, seus sistemas não são encriptados, os sistemas operacionais são falíveis e suscetíveis a manipulações e fraudes sem disparo de alertas e isso é fonte de centenas de fraudes anuais, algumas pegas pela Força Tarefa Previdenciária.
j) O PEx é uma ilusão. Abrem APS sem servidores, o resultado é a frustração e o desmonte das poucas APS operantes da região para tentar dar conta da APS nova, vide o caso de Crateús-Tauá recentemente divulgada neste blog.
Apesar dessas "pequenas" falhas, este blog recomenda a todos que trabalham no INSS e discutem previdência pública a leitura do livro "A Virada da Previdência Social", disponível gratuitamente em PDF neste link: http://portal.dataprev.gov.br/wp-content/uploads/2013/01/ViradaDaPrevidencia_online.pdf
Papel agüenta tudo mesmo.
ResponderExcluirA evolução foi tanta que o INSS foi condenado a pagar 8bilhoes de reais em revisões de benefícios por "erros" de calculo entre 1999 e 2009. Uma entre dezenas de outros erros gravissimos. Tão segurou sistema que um estagiário roubou 3 milhões de reais sem ninguém ver. O próprio ex-presidente Hauschild ligou ao vivo para o 135 e viu o que sofre o segurado.
O livro é um insulto a inteligência.
A dataprev até hoje dá panes nas segundas feiras.
Goebbels já dizia: uma mentira repetida muitas vezes torna-se verdade
ResponderExcluirA sujeira, digo, a fila foi para baixo do tapete, digo, para o mundo virtual.
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