NÃO BATE

As sinalizações são ambíguas, o que elimina a dúvida: não há intenção real de aprimorar a carreira de peritos médicos do INSS. Não há coerência entre revogação do memo 42, aquele que permite reentrada da mesma demanda na mesma instância ad nauseam e a desestruturação da instância recursal administrativa. Não há coerência entre reduzir jornada à metade como meio de combater as filas, sobretudo se a lógica da fila obedece ao erro de acesso ao INSS via perícia e continuará. Não se pode pensar em uma carreira pericial isenta e qualificada se sua remuneração manterá gratificações e metas numéricas determinadas por interesses de outras diretorias, como a de atendimento. 

"-A carreira melhora, mas terão que dar contrapartida de atender n segurados por dia". Esta frase só me diz o seguinte: A carreira não melhora. E não melhora porque a frase revela a permanência da mentalidade tacanha, do chicotinho do feitor, do não entendimento do que seja o trabalho do perito, sua representação social e econômica. Não se pode agir buscando um tempo médio cujo indicador MELHORA se o atendimento for menos zeloso com o interesse do periciado. O perito não pode ter esse tipo de compromisso e mantê-lo atrelado a si na própria Lei de sua carreira e não permite que a mesma seja plena.

Não bate; não faz sentido. Como as vítimas de golpes, como o da loteria, as vítimas dessa promessa vazia acreditam no que querem acreditar, no que lhes trás conforto e esperança e não no que a realidade demonstra. A ambição é o pecado que viabiliza o golpe e quem não fica extasiado diante da promessa de trabalhar a metade e ganhar o mesmo?

Em 2003 negociamos 11 meses, conversa iniciada ainda em 2002 no governo de transição FHC/Lula logo após o líder do PT, dep Walter Pinheiro, ter assumido, em nome do Governo eleito, no plenário da Câmara dia 06.11.2002, que criariam a carreira de perito previdenciário nos moldes das carreiras top do Executivo. Assumiu Lula e com ele o ministro Berzoine com quem tratamos do tema durante 11 meses, abortando uma greve no meio do processo para, depois, descobrirmos que a diretora de pessoas Lúcia Carvalho desenvolveu um trabalho clandestino e paralelo à negociação criando a carreira de médico com o nome de analista e salário de barnabé. Foi o estopim da grande greve que conquistou a carreira, derrubou Berzoine e deixou ganas de vingança de dar inveja ao carlismo.

Vivi tudo isso como protagonista. Sentei nos gabinetes, mofei nas ante-salas, ouvi ameaças (não de Berzoine, já que o nome dele foi citado), mas vencemos porque estávamos unidos, tínhamos apoios na sociedade e no parlamento. Como grupo, eramos muito melhores do que hoje. Mas a conquista se esvaiu, a carreira ficou anacrônica depois de grande sucesso inicial. A reforma é premente, mas o Governo quer levar vantagem, como se isso fizesse algum sentido, e fará algo muito meia-boca, algo capenga, como a vaca da ilustração, com a meta de esvaziar uma carreira qualificada tornando-a um aglomerado de prestadores de serviço melhor remunerados proporcionalmente, como comemora o Dr Geílson (a melhor remuneração horária do Executivo), mas que não ocupará cargos, não analisará dados, não formulará políticas. O Governo quer valer-se de uma reforma para garantir poder a quem é operador do caos e dele tira seu poder.

Não bate esse discurso fragmentado que nos chega e que, permanecendo assim não reformará, mas avacalhará uma jovem carreira e levará jovens e esperançosos médicos peritos à frustração. 

Advirto os mais entusiasmados: calma, não esperem tanto.