Regulamento da Previdência prevê que auxílio seja pago em até 45 dias, mas 47% das solicitações feitas no estado levam mais de um mês e meio para ser analisada
25/02/2012
00:04 Rafael Waltrick
As agências do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) no Paraná são as que mais demoram no país para analisar os pedidos de aposentadoria, auxílio-doença e auxílio-maternidade, entre outros. Segundo dados do último Boletim Estatístico da Previdência Social, de dezembro do ano passado, 47% dos benefícios solicitados naquele mês demoraram mais de 45 dias para serem examinados – quase o dobro da média nacional, que foi de 25%.
A proporção de análises que se arrastam nas agências paranaenses é 112% maior do que há apenas quatro anos e vai contra o próprio Regulamento da Previdência Social, instaurado por meio de decreto em 1999. O regulamento estipula que a primeira parcela do benefício solicitada pelo trabalhador seja paga em até 45 dias após a entrega da documentação exigida. Somente em dezembro, 1,6 milhão de benefícios foram concedidos pelo INSS no Paraná, totalizando R$ 1,1 bilhão em pagamentos.
Presente como litigante (uma das partes do processo) em 22,3% de todas as ações em trâmite na Justiça, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) tem sido alvo constante de críticas de magistrados no país. A grande quantidade de demandas envolvendo o órgão chegou a motivar, ano passado, uma consulta do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) junto aos Juizados Especiais Federais – onde o INSS está presente em 43% das ações, segundo pesquisa do próprio CNJ.
Os representantes dos juizados ouvidos pelo Conselho reclamaram da repetição de processos e recursos do INSS, contestando inclusive direitos já assegurados aos beneficiários por meio do Supremo Tribunal Federal (STF). As contestações têm abarrotado os Juizados Especiais Federais no país. Conforme relato do juiz Erivaldo Ribeiro, auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, em grande parte dos juizados os processos têm se arrastado por até quatro anos, quando as respostas definitivas não deveriam demorar mais do que seis meses.
Acordo
A Justiça Federal também tem se pronunciado contra falhas no atendimento aos beneficiários. No fim do ano passado, ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública da União (DPU) resultou em um acordo entre a Justiça Federal do Rio Grande do Sul e INSS para reduzir o tempo de espera no agendamento de perícias. Segundo a Defensoria, em muitos municípios gaúchos o prazo para realização das perícias era muito superior a 30 dias – em municípios como Porto Alegre e Novo Hamburgo, o período entre a requisição e a perícia chegava a seis meses.
Pelo acordo feito com a Justiça, o INSS teria de diminuir o tempo de espera no estado para 55 dias no início de dezembro e 45 dias no fim deste mês. Um relatório para acompanhamento das metas deverá ser apresentado dia 29.
Para especialistas em Direito Previdenciário, procuradores e entidades do setor, a demora é resultado não só da burocracia, mas, principalmente, da falta de estrutura das agências. Assim como o Paraná é o estado mais lento na concessão dos benefícios, também é o mais sobrecarregado. Em 2010, a média foi de 887,83 atendimentos por servidor nos últimos cinco anos, enquanto o número de funcionários diminuiu no Paraná, a demanda aumentou.
“Em função dessa grande demanda, o critério para a concessão dos benefícios fica incerto, justamente por não haver uma análise mais profunda. E aí, ou o trabalhador enfrenta a demora ou acaba tendo o auxílio negado injustamente”, avalia o vice-presidente da Associação dos Aposentados e Pensionistas do Paraná, Tiago Vieira.
A falta de servidores atinge também as perícias médicas. Após sofrer um acidente em Curitiba no começo de janeiro, o lavador Jackson Pereira teve de se afastar do trabalho. Duas semanas depois, ao marcar a perícia no INSS para receber o auxílio-doença, foi surpreendido: o exame só poderia ser feito dia 11 de maio, mais de quatro meses depois do agendamento.
Recurso judicial
Para a procuradora do trabalho e professora de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade Federal do Paraná Tereza Cristina Gosdal, casos como o do lavador podem ser levados à Justiça, que determinará ou não a antecipação das perícias e da concessão dos benefícios. Não à toa, o INSS aparece como litigante (uma das partes do processo) em 43,1% das ações em trâmite na Justiça Federal do país, conforme pesquisa do Conselho Nacional de Justiça.
Frente à falta de outras alternativas, a solução é procurar a ajuda dos juizados especiais federais (em Curitiba são quatro varas), assessorias jurídicas de sindicatos e núcleos de práticas jurídicas das universidades, que podem entrar com ações gratuitamente em nome do trabalhador. “Se está demorando demais [a análise do auxílio], o trabalhador pode comprovar judicialmente que precisa do benefício. Não pode acontecer de se esperar meses só para ter uma resposta”, afirma a advogada e professora de Direito Previdenciário do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba) Luciane Trippia.
Concurso prevê 181 novos servidores para o Paraná
Estado mais “sobrecarregado” em número de atendimentos, o Paraná irá receber uma fatia razoável das vagas previstas no último concurso feito pelo órgão, dia 12 de fevereiro. Dos 1.875 novos servidores, 181 ficarão lotados nas 61 agências paranaenses – o equivalente a 9,6% do total espalhado pelo Brasil. Serão 129 técnicos do seguro social e 52 peritos.
A previsão é que os primeiros postos em todo o país sejam preenchidos a partir do mês que vem, com a nomeação de 900 técnicos e 150 peritos. Já as demais vagas devem ser ocupadas entre julho e novembro deste ano. A autarquia não informou quantos servidores serão deslocados para o Paraná neste primeiro momento.
Para o INSS, a vinda dos novos servidores deve garantir que o tempo de análise e concessão dos benefícios diminua e a carga de trabalho sobre cada funcionário seja menor. A nomeação dos novos técnicos e peritos, inclusive, será acompanhada da ampliação do horário de atendimento das agências, que passarão a funcionar de forma ininterrupta, das 7 às 19 horas – hoje, a grande maioria atende das 8 às 17 horas.
No total, 737 agências do país, o equivalente a 55% do total, irão atender pelo novo horário. Os peritos médicos lotados nesses postos terão de cumprir uma meta de 15 exames diários, o que, segundo o INSS, deve aumentar o número de perícias realizadas.
Ceticismo
Mesmo as medidas tomadas pela autarquia, porém, ainda são vistas com ceticismo por entidades e especialistas. Para o vice-presidente da Associação dos Aposentados e Pensionistas do Paraná, Tiago Vieira, o reforço não deve ser suficiente para atender toda a demanda no estado. “Pode suprir um pouco a necessidade atual, mas ainda não tornará o serviço eficaz como deveria ser”, reforça.
Já o procurador federal e professor de Processo Civil e Direito Previdenciário da Universidade Positivo Alberto Rodrigo Papino defende que a melhora no atendimento, mesmo com o reforço no número de servidores, só será mesmo efetiva com a desburocratização das regras e leis para a concessão dos benefícios. “O INSS é um órgão público e, por isso, só pode fazer o que a lei determina. Então, o servidor está atrelado à lei e às vezes exagera nas formalidades, mesmo que estas não sejam essenciais na análise do benefício. A lei deveria ser menos burocrática para não prejudicar o cidadão”, completa.