Estresse aumenta número de auxílios-doença em Alagoas
Concessão de benefícios por problemas psiquiátricos causados pelo trabalho teve crescimento de 64% em dois anos
22/01/2012 08:46
Alana Berto / Tribuna Independente
A professora Eva Maciel, de 59 anos, trabalhou durante muito tempo em salas de aulas e, apesar de ser apaixonada pela profissão, foi ficando desmotivada com todas as dificuldades que enfrentava diariamente para conseguir ser educadora. As condições de trabalho somadas ao estresse normal da atividade ocasionaram nela uma depressão. Hoje, Eva está de licença da escola onde trabalha e toma antidepressivos. Ela diz que não possui a mínima condição de voltar a dar aulas.
“Quando eu comecei com depressão, eu ia trabalhar e parecia que estava indo para a forca. Meu sonho sempre foi ser professora, mas a gente vai se decepcionando”.
Da mesma forma que Eva, vários profissionais de todas as categorias enfrentam as doenças psiquiátricas da atualidade: o estresse, a depressão e a ansiedade, que são causados em consequência de transtornos enfrentados no trabalho durante o dia-a-dia.
O número de benefícios por estresse tem aumentado muito nos últimos anos e de acordo com a perita médica previdenciária chefe da sessão de saúde do trabalhador no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Cândida Falcão, tende a crescer mais. Dados do INSS mostram que em 2009 foram concedidos 615 auxílios-doença acidentários relacionados a doenças mentais. Já no ano de 2010 foram concedidos 901 benefícios, um aumento de 46,5%. Em 2011, esse valor aumentou para 1062 benefícios concedidos para pessoas que tiveram doenças psicológicas ocasionadas pelo trabalho, ou seja, um aumento de 17,8% em relação a 2010.
Nos dois anos, foram 64,3% de crescimento. “Essas doenças têm sido intensificadas pela correria em que as pessoas vivem, enfrentando cobranças no trabalho, engarrafamento. Tudo isso influi”, alega.
Cândida ainda destaca que a maioria dos benefícios ocorre por doenças psiquiátricas. Esses problemas ocorrem mais entre a classe baixa, mas estão crescendo entre a classe média. Além disso, os profissionais autônomos também sofrem muito com o tipo de doença.
Médica aponta profissões mais afetadas
De acordo com a médica perita do INSS, Cândida Falcão, as categorias profissionais que mais sofrem com transtornos no trabalho são motoristas de ônibus, cobradores, bancários e atendentes de telemarketing.
“Os motorista de ônibus ficam amedrontados por conta de assaltos que acontecem nos coletivos e terminam ficando com transtorno pós-traumático. Por isso, o governo está investido no Caps [Centro de Atenção Psicossocial]”, esclarece. Transtorno pós-traumático foi o que aconteceu com a cobradora Maria José dos Santos, de 45 anos, que deixou de trabalhar há um ano e oito meses. Depois de presenciar três assaltos, todos com revólver apontado para sua cabeça, enquanto estava exercendo seu trabalho, Maria José entrou em depressão e também convive com a síndrome do pânico. Ela ficou agressiva com os passageiros e não conseguia dormir. “A empresa só vai dar baixa na minha carteira daqui há dez anos. O INSS ainda acha que tenho condições de voltar a trabalhar, mas não tenho”, assegura.
Insegurança fez cobradora se afastar
Não é a primeira vez que a cobradora de ônibus Maria José se afasta do trabalho. Ela diz que convive com a depressão há 12 anos, mas que seus proble¬mas de saúde começaram dentro da empresa. Maria José toma remédio controlado e é a segun¬da vez que pede afastamento.
“Tomo remédios fortes e acho que vou depender desses medicamentos a vida inteira. Tem muita gente que acha que eu não tenho problema”, enfatizou.
Maria José acha que a únIca coisa que poderia acabar com seu estresse seria a segurança. “Já pensou deitar na sua cama e pensar como será amanhã, se estarei viva? O governador de¬veria investir em mais segurança”, analisa.
Entretanto Maria José contou que não enfrentou nenhum empecilho do INSS ou da empresa onde trabalha para conseguir o beneficio.
Desde 2009, o INSS estabeleceu um nexo técnico epidemiológico, e o médico pode fazer o diagnóstico sem precisar da Comunicação de Acidente de Trabalho. “Hoje não precisa mais disso. O perito pode estabelecer se tem relação ou não com o trabalho. A empresa tem liberdade para contestar e a gente vai avaliar”, afirma a médica perita Cândida Falcão.
Paciente pode ser reabilitado pelo INSS
Na avaliação do trabalhador que vai ao INSS pedir benefício por doença mental causada pelo trabalho, o perito médico analisa o que a doença causa e o tempo de recuperação. Quando a pessoa se torna incapaz de exercer o trabalho, o INSS promove a reabilitação profissional, através de cursos profissionalizantes. “Muitas pessoas quando mudam de profissão começam a ganhar mais do que antes”, afirma Cândida Falcão, médica perita.
As doenças da “atualidade” não param de surgir. Cândida aponta que agora existe muitas pessoas sofrendo com a síndrome de Burnout - do inglês queimar por completo -, também conhecida como “Síndrome do esgotamento profissional”. Ela tem como causa a dedicação exagerada ao trabalho e o espírito de competitividade. Quem tem a síndrome mede a autoestima pela capacidade de realização e sucesso profissional. Entretanto quando esse desempenho não é reconhecido, o paciente passa a ter um comportamento agressivo e a ficar desmotivado no trabalho.
Psicóloga aponta como causa das doenças do trabalho a competitividade
A psicóloga Lenice Pimentel afirma que muita gente está adoecendo pelas relações de trabalho. O estresse pode se manifestar como depressão ou doenças psicossomáticas – quando o corpo adoece em função das questões emocionais. Ela esclarece que o trabalhador só vai para o INSS após um período de licença e, depois, entra em benefício. “O primeiro passo é buscar a rede médica”, destacou. Lenice acrescenta que mais pessoas estão pedindo benefício por doenças psicológicas por conta das exigências e competitividade no trabalho que estão maiores.
Se o INSS passar a achar que INSATISFAÇÃO PROFISSIONAL ou INSEGURANÇA PROFISSIONAL é igual a incapacidade laborativa, o fim do mundo virá antes de 2012.
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