O Novo modelo de perícias parece ser, mal disfarçadamente, uma tentativa de terceirização “legalizada” da perícia médica cujos objetivos, por outro lado, nenhum pouco disfarçáveis são o barateamento dos custos a qualquer custo, não importando se a qualidade técnica e científica do laudo é boa ou não, mas muito antes pelo contrário parece tencionar de forma deliberada o laudo pericial de qualidade duvidosa, de frágil sustentação argumentativa, facilmente contestado judicialmente, visando apenas a quantidade de perícias feitas com o menor rigor possível, o que resultará no maior número possível de concessões de benefícios indevidos, os quais, se analisados com maior critério médico-legal, não ensejariam no enquadramento de direito, afinal é humanamente impossível para o médico assistente, muitos trabalhando no já sobrecarregado SUS, dispensar o cuidado e zelo necessários para se fazer uma avaliação sobre INCAPACIDADE X TRABALHO e emitir um laudo específico fornecido pelo INSS para tal fim.Mas, dos erros “para mais” ninguém reclama, não dá mídia, mas dá votos e dividendos políticos.
A pirotecnia midiática que demoniza o bom perito será substituída pela pirotecnia dos cofres públicos, jorrando o dinheiro do cidadão honesto que contribui para a Previdência nas minas de benefícios concedidos de maneira célere, duvidosa e, provavelmente, ilegal e antiética. Mas, quando mesmo é que a mídia irá demonizar o médico que concedeu um benefício para um cidadão que não lhe era devido, mas que ficou por anos a fio recebendo? Por quê isto não aparece?
O Novo Modelo de Perícias irá terceirizar o ato pericial. Até aí não há ilegalidade, apenas intenção de enfraquecer a perícia qualificada, especializada, que precisaria estar necessariamente revestida dos atributos de isenção e imparcialidade por tratar-se de atividade judicante; e o simples fato de transferir a responsabilidade deste ato para médicos assistentes implica em perda clara e irreparável desta imparcialidade e isenção por várias razões. Mas talvez o nosso país não esteja preparado para ter uma perícias boa (com estímulo à qualidade técnica, autonomia e capacitação profissional) e idônea, porque ser bom e honesto incomoda muito por estas bandas. Não parece incomodar ao governo a nova tentativa de terceirizar a perícia, pulverizando as pedras no seu sapato, barateando os custos para a Previdência e aumentando a concessão de benefícios indevidos, como já resta históricamente comprovado em diversos documentos, estudos, reportagens e, sobretudo, pelo brilhante relatório do TCU de 2010.
Mas, a pergunta que não quer calar é: quem pagará os médicos assistentes que serão transformados em peritos? O INSS ou o trabalhador? Será que o trabalhador terá que arcar com mais impostos e pagar o médico assistente para preencher o formulário elaborado pela seguradora pública que é o INSS a fim de ganhar o que lhe é de direito? Não seria um contrassenso:ter que pagar para ter o direito de receber. É como dar com uma mão e tirar com a outra, ou melhor, tirar com a outra e depois dar com uma mão.
Bom, antes de responder a este questionamento cabe-nos fazer uma reflexão. O parágrafo primeiro do artigo 43 da lei 8213, além de outras normas e decretos, assim apregoa, in verbis: “A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social...”. Este é o ponto crucial a ser discutido. A própria lei já define que o critério a ser avaliado mediante exame médico para fins de concessão do benefício é a verificação da condição de incapacidade. O médico assistente irá preencher o formulário da seguradora INSS com o fito de verificar a existência de incapacidade de forma fundamentada e correlacionada com a atividade profissional do requerente assegurada pela Previdência ou apenas, sem maiores rigores, sem conhecimento da legislação trabalhista e previdenciária, irá conceder um tempo de repouso da patologia, limitado a 60 dias, em consonância com uma tabela que irá determinar o tempo máximo de repouso de cada patologia e interferir diretamente na autonomia médica? Se o que for avaliado tratar-se de tempo de repouso da patologia, a concessão de benefícios pela Previdência estará infringindo a lei, pois a seguradora Previdência não estaria autorizada a pagar aquilo que não está segurado – e o que está segurado é a capacidade de trabalho, e não a doença, a qual pode ou não resultar em incapacidade para o trabalho.
Por outro lado, se a intenção do governo não é transformar a Previdência Social no Brasil em um modelo de distribuição de renda que deveria ter seu nome, então, mudado para Bolsa-Doença (já que a incapacidade deixou de ser seguro), se a Previdência Social tem a intenção de manter-se como seguradora com o objeto preconizado pela lei 8213 e pela Constituição Federal caberá ao governo, quando promover a terceirização da perícia para médicos sem compromisso institucional com o INSS, formular quesitos para serem respondidos a fim de assegurar que o benefício a ser concedido terá o mínimo de critérios para que tenha sustentabilidade legal, em outras palavras equivale a dizer que o médico assistente terá que fixar datas de início de doença, datas de início de incapacidade, se a doença isenta ou não de carência, se a doença é pré-existente à condição de segurado, etc.Em outras palavras: o médico assistente terá que ser perito!Pois atuará como perito!
O Código de Ética Médica determina de maneira clara que configura-se infração ética a atuação do médico assistente como perito de paciente seu em seu artigo 93, in verbis: “ é vedado ao médico ser perito ou auditor do próprio paciente...”.Penso que são claras as razões para tanto, afinal o conflito entre as atribuições, deveres e tarefas de um e de outro são bem marcantes e justificam o ato normativo profissional, sob pena de haver perda de imparcialidade e isenção, interferindo uma função sobre a outra de maneira direta. Destarte,como consequência imediata disto caberá à seguradora INSS elaborar formulários próprios com quesitos específicos para avaliação de incapacidade, a qual, por sua vez, somente poderá ser realizada por um médico assistente que nunca teve prévio contato com o paciente/periciado/pleiteante a um futuro benefício para que não haja comissão de infração ética. Este esquema chama-se de triangulação, exposto pelo distinto colega aldofranklin aqui no perito.med. Existirão os encaminhamentos de assistentes para outros assistentes fazerem perícias de pacientes seus.”Prezado colega, este é um paciente muito querido meu, não poderá deixar de fazer as cinco consultas de retorno que desde já estão programadas para ele fazer”.”Ah é?! E qual é o diagnóstico?”.”É uma gripe...mas, veja bem, não é uma gripe qualquer....é daquelas bem fortes, sabe?!”.Ah...sei...”.É claro que tudo por telefone, afinal seria pouco elegante um encaminhamento formal feito nestes termos.
Divagações à parte, chegamos à seguinte situação: a maioria dos segurados do INSS depende de médicos do SUS e a maioria dos estabelecimentos de saúde do SUS não dispõe de computadores para fazer a certificação digital dos atestados que serão fornecidos a pacientes encaminhados por outros assistentes a fim de se fazer uma consulta cujo fito é exclusivamente o de se realizar a perícia. Não será uma consulta, oras!Será uma perícia!.Mas, computadores no SUS? Não tem dipirona, buscopan e macas, mas terão computadores?O que é certificação digital, então? E a fila do SUS?Ah...a fila do SUS não importa, são poucos que reclamam e quando reclamam quase não aparece na mídia porque não interessa ao governo e aos órgãos de controle em grande parte das vezes; e quando aparece na mídia é apenas para expôr ao rídiculo os únicos culpados pela saúde vergonhosa do nosso país- os médicos!
Entretanto, o entrave maior é que o médico assistente do SUS não é obrigado nem legal e nem éticamente a fazer perícias, podendo se recusar a atuar ali como perito. Legalmente porque a Constituição Federal define bem as atribuições da Saúde e as da Previdência, mas como no Brasil têm a mania de querer misturar tudo em um só balaio de gato, tentam empurrar goela abaixo mais este monstrengo híbrido como uma mutação fria da lei, executada somente pelo executivo. Os médicos do SUS são obrigados legalmente a atender doentes, e não a verificar incapacidade nestes doentes, porquanto tal ato já configurar-se-ía perícia.E a responsabilidade e dever do INSS é a verificação de incapacidade mediante perícia a cargo da Previdência Social como manda a lei.A cargo não significa que tenha que ser feito por perito do Quadro da Previdência obrigatoriamente, mas significa qua a Previdência tem que arcar com o ônus logístico e financeiro do ato, mesmo que seja terceirizado.O Ministério da Saúde e o CONASEMS já deixaram bem explícitas as razões pelas quais não admitem a exorbitância de intenções e interesses da Previdência junto só SUS (Saúde).O CRM tem o parecer, publicado há poucos dias aqui no perito.med, que estabelece que formulários de seguradoras não poderão ser preenchidos por médicos assistentes que prestaram atendimento à pessoa na condição prévia de paciente, já que estão a pleitear direitos que redundam em benefícios pecuniários e na análise de elementos e critérios médico-legais, que ultrapassam a esfera de competência de atribuições do médico assistente, motivo pelo qual o parecer do CFM entende que o médico poderá cobrar financeiramente pelo preenchimento do laudo da seguradora.
O Parecer 23/2011 do CFM explicita em um excerto: “...o preenchimento desses formulários deveria ser efetuado, tanto em caráter público quanto privado, sob a responsabilidade das próprias seguradoras, disponibilizando para tal um médico perito cujos honorários deveriam ser cobertos pelas mesmas.”.Novamente a pergunta que não quer calar ressurge: “Quem pagará aos médicos assistentes as perícias que eles realizarão?”.Acho que fica fácil perceber que, devido a todos os entraves, deficiências, superlotação e não-obrigatoriedade do médico assistente, estas perícias não serão feitas no SUS!
No consultório privado o requerente a um benefício da Previdência poderá fazer perícia com aquele médico que se dispuser a correr o risco de contrariar os interesses do requerente a obter um benefício, após receber um encaminhamento, invariavelmente, do colega que prestou o atendimento direto do paciente (o assistente-assistente). Pois bem, o assistente-perito, sem infringir a ética, terceirizadamente, em seu consultório particular, irá avaliar o doente, verificar se há ou não incapacidade laborativa, preencher o formulário do INSS e encaminhá-lo com certificação digital para os computadores da Previdência reconhecerem automaticamente o benefício a cargo do paciente/segurado, e não a cargo da Previdência como mandaria a lei.
Assim, em uma jogada de mestre a Previdência fará em uma só tacada uma dupla terceirização: a dos peritos do seu Quadro, que terão suas funções ocupadas pelos assistentes-peritos e a dos segurados, que terão que arcar com os custos da perícia que avaliará o enquadramento ou não no direito ao benefício que pleiteia. Já vimos um filme parecido com este antes, mas só tínhamos visto a metade do filme. E agora o filme é em 3D! Não há nada que não possa ser piorado!
6 comentários:
O segurado paga pelo Atestado pois quer o beneficio!
Quer valer quanto que o que ocorrer é triangulação?
Uma coisa é a lei 8080, outra coisa é a 8213! Mas um dos melhores da Gestão é a balela de equipe multiprofissional para a lei 8472...e a CIF por equipe multiprofissional?
- Suestao: "todo brasileiro tem direito a um beneficio após o nascimento, no mínimo de 01 salario mínimo, ate morrer", vou mandar pro matemático que agora temos no iNSS
O INSS vai dizer que o médico assistente não está fazendo a perícia. Está só preenchendo um formulário, tal qual já faz atualmente, no momento em que responde um SIMA.
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O INSS vai dizer para o MPF e para o SUS que, no INSS, sempre terá um perito que fará a perícia "à distância", sem ver o periciado, chancelando a perícia.
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Eles irão dizer que, ao chancelar a "sugestão" de 60 dias do médico assistente, quem fez a perícia foi o perito do INSS, e o assistente só ofereceu informações e sugestões do período "necessário para a melhora clínica".
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Aliás, o presidente do INSS já começou a dizer isto, quando informou a Folha de São Paulo que haverá um perito no INSS chancelando todas as perícias.
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E todos irão acreditar. Na verdade eles querem acreditar, só esperam a primeira desculpa oficial do INSS para acreditarem piamente naquilo e considerar a coisa como caso resolvido.
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É, quem vai ter que chiar contra tudo isto seremos nós. Até nossas representatividades (CFM/CRM, associação médica e federação dos médicos, além da ANMP) não estão dando a mínima para o caso. Nem se pronunciaram.
Meu filho, perícia distancia nao pode!
;-)
Ah, noiz nao vai chiar, noiz deixa arder...
Quando o homi perceber que as conta nao para de crescer, o homi vai nos chamar, pra noiz conversar, pra questão se resolver, noiz pede os benefici que noiz que, pra o caso resolver, ai, noiz terá valor!
É ... não pode ... mas vai ser assim.
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Este negócio de "pode" e "não pode" não se aplica ao governo. Para este, tudo pode.
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