domingo, 8 de janeiro de 2012

A HIERARQUIA DOS ATESTADOS MÉDICOS

O tema da hierarquia dos atestados médicos foi novamente levantado esta semana em consequencia da cena lamentável ocorrida em Campinas SP quando um trabalhador segurado demonstrara, da maneira mais institiva, toda a sua revolta portando uma faca dentro da APS. Em síntese, no seu relato ele dizia que "estava sendo jogado de um lado para o outro"; que o médico da empresa não o permitia que retornasse ao trabalho contrariando a decisão da Perícia Médica do INSS que lhe cessara o benefício. Situação extremamente comum. Ele teria ficado 3 meses sem receber qualquer salário obviamente com repercussões muito negativas em sua vida pessoal e social. A falta de consenso entre as partes quebra nas pernas do segurado infelizmente, mas não deveria ser assim.
A legislação já estabelecera de que forma a situação deve ser juridicamente entendidada e apaziguada com a existência de uma classificação hierarquica dos atestados médicos. O colega Marcos Medanha (que tem Blog recomendado no Perito.med) escreveu sobre o assunto de maneira inteligente, objetiva e técnica no
seu artigo amplamente publicado (copiado abaixo). Existe uma hierarquia na qual o Perito Médico do INSS é o topo da lista e a sua decisão deve, ou pelo menos deveria, ser respeitada e acatada até que seja  contrariada pelo Poder Judiciário -  observe que o médico assistente, diferentemente do muita gente renomada apregoa, é o último da lista.
Infelizmente a privação da autonomia técnica e científica a qual o Perito do INSS está submetido administrativamente enfraquece o seu poder de decisão e torna esta relação, no mínimo, instável e sujeita à críticas.  Por exemplo, ele, o perito, deveria, sem dúvidas, em quaisquer casos duvidosos, ter por obrigação a realização de vistoria no posto do trabalho do empregado e acesso ao histórico laboral e de doença, coisa que o Médico do Trabalho da empresa faz e tem. A ausência deste elemento o retira da sua posição hierarquica e todos perdem gerando este tumulto. Por isso a autonomia e a valorização do Perito do INSS é extremamente importante para que as decisões sejam mais forte e subsidiadas e casos como o da APS de Campinhas não se repitam. Abaixo o texto recomentado:

Existe hierarquia entre os atestados médicos?
Escrito por Marcos Henrique Mendanha
06 de Julho de 2011

Vejamos o que nos diz a vigente Lei 605 / 1949, Art. 6o, parágrafo 2º: “A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha.”

Interpretando: primeiro, cabe-nos lembrar que a Lei 605 / 1949 é aplicada somente para empregados de empresas privadas, ou para servidores públicos regidos pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Demais servidores públicos poderão ter regras próprias, diferentes das regras trazidas pela Lei 605 / 1949. Pela análise da Lei, percebemos também uma clara hierarquia entre os atestados médicos para fins de abonos de faltas ao trabalho. A palavra “sucessivamente” não deixa nenhuma dúvida quanto a isso. Conforme essa hierarquia, assim são valorados os atestados médicos:

• 1º lugar: atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado (ex.: médico perito do INSS);

• 2º lugar: atestado de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria;

• 3º lugar: atestado de médico da empresa (médico do trabalho) ou por ela designado (incluindo aqui a figura do chamado "médico examinador”);

• 4º lugar: atestado de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública;

• 5º lugar (e último): qualquer outro médico que o trabalhador escolher.

Assim, fica respondida a pergunta que origina esse texto: “existe hierarquia entre os atestados médicos?” Resposta: pelo menos para trabalhadores do Direito Privado, e servidores públicos submetidos ao regime da CLT, sim. Para os demais servidores públicos, valerá o que houver sido estabelecido em estatuto/contrato próprio.

Assim, concluímos, por exemplo, que: quando o médico da empresa discorda do médico assistente do empregado (ex.: um ortopedista) com relação ao número de dias de afastamento do trabalho, o médico da empresa age sob a mais perfeita legalidade, por mais polêmico que isso possa parecer aos olhos de muitos. Nessa mesma esteira, temos o Parecer 3.657 / 2009 do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), que assim coloca:

“Ao médico do trabalho, no exercício de suas atividades dentro do âmbito da empresa, é facultada a possibilidade de discordar de atestado médico apresentado pelo trabalhador, assim como estabelecer novo período de afastamento decorrente de sua avaliação médica, sempre assumindo a responsabilidade pelos seus atos.”

Importante salientar que ao discordar do atestado emitido por um profissional assistente do empregado, o médico da empresa assume a responsabilidade pelos dias de afastamento não concedidos, caso haja agravamento da doença aludida.

Ratificamos também, que o médico da empresa só pode discordar de atestados médicos de poder hierárquico inferior. Por exemplo: o médico da empresa poderia até discordar do atestado emitido pelo ortopedista de confiança do empregado, mas não poderia discordar do número de dias de afastamento proposto pelo médico perito do INSS, pois o atestado desse último representa o atestado de maior valor legal, conforme vimos através da hierarquia trazida pela Lei 605 / 1949.

É muito comum a situação onde se observa que o médico da empresa considera o empregado “inapto” ao trabalho, e o médico perito do INSS considera o mesmo empregado “apto”. O que ocorre nesse exemplo, por mais questionável que seja, é perfeitamente legal, calcado da literalidade da Lei 605 / 1949. No caso, a decisão do tempo de afastamento do trabalho determinado pelo médico perito do INSS (primeiro lugar na hierarquia dos atestados), prevalece sobre a mesma decisão tomada pelo médico da empresa (terceiro lugar na hierarquia dos atestados). Na mesma esteira, temos a Lei 11.907 / 2009, que em seu Artigo 30, parágrafo 3, assim coloca:

"Compete privativamente aos ocupantes do cargo de Perito Médico Previdenciário ou de Perito Médico da Previdência Social (...), em especial a: (I) emissão de parecer conclusivo quanto à capacidade laboral para fins previdenciários."

Falamos nesse texto apenas sobre a abordagem legal da hierarquia dos atestados. No entanto, quando o tema é “saúde do trabalhador”, vários outros aspectos estão envolvidos e merecem ser considerados: aspectos sociais, aspectos éticos, aspectos morais, etc. A pauta está aberta, e as opiniões são inúmeras. Ao debate!

Marcos Henrique Mendanha é médico especialista em Medicina do Trabalho e advogado especialista em Direito do Trabalho. É professor de cursos de pós-graduação em Medicina do Trabalho, Perícia Médica e Direito Médico. No Twitter, @marcoshmendanha. Contato: marcos@asmetro.com.br

2 comentários:

Ten. Catão disse...

Prezado Heltron. Muito oportuna sua consideração, principalmente quando diz que "...o Perito do INSS... deveria, sem dúvida, em quaisquer casos duvidosos, ter por obrigação a realização de vistoria no posto do trabalho do empregado e acesso ao histórico laboral e de doença, coisa que o Médico do Trabalho da empresa faz e tem. A ausência deste elemento o retira da sua posição hierarquica e todos perdem gerando este tumulto. Por isso a autonomia e a valorização do Perito do INSS é extremamente importante para que as decisões sejam mais forte e subsidiadas e casos como o da APS de Campinhas não se repitam...". É a respeito disso que várias vezes neste ótimo Blog opino e sou demasiadamente mal interpretado. Para que não se conceda ao Perito Médico Previdenciário o que você argumenta que seria primordial em caso de dúvida durante a perícia e principalmente para Valorizar a figura do Perito, o que o governo faz? Cria o NTEP, baseado em quais estudos médico - epidemiológico - científico ninguém sabe, pois até hoje não foi aberto para consulta, o que na comunidade científica mundial, em qualquer estudo SÉRIO os métodos utilizados são abertos à consulta pública.
Por experiência de mais de Dez anos atuando em Medicina do Trabalho e Saúde do Trabalhador TODAS as vezes que houve discordância entre mim e a Perícia Médica do INSS e solicitei que um Perito Médico Previdenciário fosse à empresa para visitar o local de trabalho, seja por negação de Benefício, seja por concessão de Nexo Causal, seja por trâmites de Reabilitação Profissional, no fim do processo o Perito concordou comigo. Isso prova que você, caro Heltron, está CORRETÍSSIMO em sua consideração que destaquei no início.

Renato Pontilis disse...

Prezado Heltron você com o conhecimento que tem me responde uma coisa esta tal NTEP Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário segundo o proprio saite da previdencia
O NTEP, a partir do cruzamento das informações de código da Classificação Internacional de Doenças – CID-10 e de código da Classificação Nacional de Atividade Econômica – CNAE aponta a existência de uma relação entre a lesão ou agravo e a atividade desenvolvida pelo trabalhador. A indicação de NTEP está embasada em estudos científicos alinhados com os fundamentos da estatística e epidemiologia. A partir dessa referência a medicina pericial do INSS ganha mais uma importante ferramenta-auxiliar em suas análises para conclusão sobre a natureza da incapacidade ao trabalho apresentada, se de natureza previdenciária ou acidentária.
Fuciona ou e mais cruzamento de dados sem controle e sem proficionais para mantelo em ordem ou vai ficar igual ao CNIS Cadastro Nacional de Informações Sociais que tem experiência de trabalho na qual não foi exercida e não bate com que ta na carteira de trabalho será que cruzamento de dados funciona no Brasil temos o pior sistema de internet o pior que este cruzamento falho acaba estourando no perito sei por experiência própria quando vi em minha LMP profissões que não exerci mais depois analisando vi que tal informação a perita teve pelo CNIS resumindo ela fez o dever dela nesta parte terminando meu ponto de vista primeiro deve se fazer oferecer condições segura para o perito exercer sua função com consultório digno valorização do cargo e buscar fazer estes cruzamento de dados quando realmente tiver um sistema confiável