Existe um documento em vigor do Exército Brasileiro produzido para conceituar e qualificar o Agente Médico Pericial e sua atividade Médica-Legal. E o faz de maneira extremamente feliz. Deixa clara a relação de desconfiança existente entre as partes, a resistência dos periciandos, as qualidades necessárias para ser um perito, a quem se dirige o laudo médico e, claro, fortifica o pilar da imparcialidade. Um documento fabuloso.
Boa Leitura.
Heltron Xavier
Portaria n.º 247 – DGP, de 07 de outubro de 2009
Aprova as Normas Técnicas sobre as Perícias Médicas no Exército
“1.5 – O AGENTE MÉDICO-PERICIAL (AMP)
1.5.1 – O AMP E SUA RELAÇÃO COM O INSPECIONADO
Há que se distinguir a posição do médico que examina a pessoa, médico-assistente, com o objetivo de tratá-la e a do médico que a examina na qualidade de perito (AMP). Enquanto o paciente escolhe seu médico livre e espontaneamente, o inspecionado, ao contrário, é encaminhado por autoridade competente a comparecer diante de um perito ou junta de peritos para verificar se o seu estado de saúde, as seqüelas da sua doença ou lesão e o comprometimento de sua capacidade laboral são enquadrados pela legislação, com vistas à obtenção de um direito.
O paciente tem todo o interesse de informar ao seu médico-assistente sobre os seus sintomas e como surgiram, tendo a convicção de que somente assim o médico poderá chegar a um diagnóstico correto e ao tratamento adequado. O mesmo, na maioria das vezes, não ocorre nas perícias. Nestas, o inspecionado busca um resultado que lhe seja favorável. Para tanto, presta somente as informações que possam conduzir ao resultado pretendido, sendo usual a omissão e a distorção de fatos ou sintomas importantes para a conclusão pericial.
Na relação médico-paciente há um clima de mútua confiança, enquanto na relação pericial, ocorre exatamente o contrário, acrescido do fato de que o inspecionado não terá qualquer benefício terapêutico ou de alívio para os seus males. O perito não deve ser afetado pelo inspecionado em nenhum sentido, devendo ser neutro para julgar os fatos e ter como norte o que prescreve a lei. Isso não significa falta de cortesia, atenção ou tratamento educado por parte do perito.
1.5.2 – O AMP E SUA RELAÇÃO COM A INSTITUIÇÃO (EB)
No exercício da função pericial, a relação perito-inspecionado é diferente da relação médico-paciente observada no exercício da função assistencial. Sua atuação é exercida em função do interesse público, que é o da lei.
Quando o médico estiver exercendo a atividade pericial, não se pode pretender que, como perito, deixe de revelar o que souber em decorrência do exame ou de informação do inspecionado. O AMP ao proceder a um exame para fins de licença, ou concessão de benefícios, tem a obrigação de comunicar aos setores próprios da instituição as informações necessárias que permitam a aplicação da legislação pertinente.
1.5.3 – COMPORTAMENTO DESEJÁVEL
1.5.1.1 Evitar conclusões intuitivas e precipitadas.
1.5.1.2 Falar pouco e em tom sério.
1.5.1.3 Ser modesto e ter pouca vaidade.
1.5.1.4 Manter o segredo exigido.
1.5.1.5 Ter autoridade para ser acreditado.
1.5.1.6 Ser livre para agir com isenção.
1.5.1.7 Não aceitar a intromissão de ninguém.
1.5.1.8 Ser honesto e ter vida pessoal correta.
1.5.1.9 Ter coragem para decidir.
1.5.1.10 Ter competência profissional para ser respeitado.
1.8 – EXAME MÉDICO PERICIAL
1.8.1 – CARACTERÍSTICAS DO EXAME MÉDICO
Ao contrário do exame médico assistencial, no exame pericial o inspecionado não escolhe o médico que procederá ao exame. Dessa forma, o inspecionado comparecerá a um exame que, em geral, não escolheu fazer, realizado por interesse de um terceiro, em cumprimento a normas legais ou para o esclarecimento de uma autoridade, muitas vezes trazendo consigo uma carga de preconceito formada pela percepção negativa de conhecidos que se submeteram a esse tipo de exame.
O perito, no ato da perícia, está sujeito a ter sobre si a projeção de uma série de fantasias, pois representa para o inspecionado uma autoridade que está ausente. E ainda pior, se há uma expectativa de direito que só poderá se concretizar após o resultado da perícia, o perito poderá ainda representar naquele momento o maior entrave à concretização dessa expectativa, aumentando ainda mais a resistência do inspecionado a fornecer informações fidedignas, ou pelo menos aquelas que ele imagina poder prejudicá-lo na perícia.
É sabido que o perito não pode ter compromisso com qualquer das partes envolvidas, mas apenas com os fatos observados na perícia.
A forma de registro dos dados observados no exame difere do exame médico assistencial, uma vez que toda perícia tem um objetivo específico e os dados de interesse são aqueles que atendem a esse objetivo.
Quanto ao resultado, diferentemente do exame assistencial, será público, com nível de publicidade diverso, dependendo do tipo e finalidade da perícia realizada.
1.8.2 – CARACTERÍSTICAS DA PESSOA EXAMINADA
A primeira diferença está no nome. Em medicina assistencial é o paciente e na pericial, o inspecionado ou periciado (inspecionando ou periciando, dependendo do momento do relato da perícia). O inspecionado nunca deve ser chamado de paciente, para evitar alguma confusão com possibilidade de parcialidade da perícia.
Outra diferença está no grau de envolvimento com o exame. Na medicina assistencial o paciente tem todo o interesse de informar o mais correta e completamente possível, pois daquele exame pode depender a recuperação de algo que já perdeu (a saúde, o bem-estar, tempo de vida, etc.), ou a possibilidade de evitar a perda de algo, se o exame é de caráter preventivo. A relação médico-paciente é idealmente caracterizada por uma relação de empatia, na qual o paciente deposita em seu médico toda a confiança. Já na perícia, dependendo da percepção do risco de não obter algo que deseja ou que considera ser direito seu, o inspecionado pode tentar uma interferência ativa no exame, escondendo dados ou fatos, falseando ou inventando queixas, desenvolvendo quadros na forma que imagina serem suficientes para garantir o que deseja. É uma característica do exame pericial a desconfiança e a resistência por parte do periciado. O médico, em lugar de se irritar ou incomodar com esse fato, deve saber se utilizar dessa característica do comportamento do inspecionado para obter informações que lhe sejam relevantes.
1.8.3 – DESTINO DO RESULTADO DO EXAME
No exame médico assistencial, o destino do exame é o próprio paciente e, eventualmente, seus familiares, com a finalidade de tratamento. Já no exame pericial, seu destino são autoridades judiciais ou administrativas com a finalidade de prestar esclarecimento sobre assunto afeto à área médica, visando decisões em âmbito judicial ou administrativo.
1.9 – DAS FINALIDADES
1.9.1 A inspeção de saúde tem por finalidade avaliar a integridade física e psíquica do inspecionado, a fim de emitir um determinado parecer que subsidie tomada de decisão sobre direito pleiteado ou situação apresentada por autoridade competente.”.
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