Escrito por Marcos Henrique Mendanha
Qua, 06 de Julho de 2011 08:46
Vejamos o que nos diz a vigente Lei 605 / 1949, Art. 6o, parágrafo 2º: “A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha.”
Interpretando: primeiro, cabe-nos lembrar que a Lei 605 / 1949 é aplicada somente para empregados de empresas privadas, ou para servidores públicos regidos pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Demais servidores públicos poderão ter regras próprias, diferentes das regras trazidas pela Lei 605 / 1949. Pela análise da Lei, percebemos também uma clara hierarquia entre os atestados médicos para fins de abonos de faltas ao trabalho. A palavra “sucessivamente” não deixa nenhuma dúvida quanto a isso. Conforme essa hierarquia, assim são valorados os atestados médicos:
• 1º lugar: atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado (ex.: médico perito do INSS);
• 2º lugar: atestado de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria;
• 3º lugar: atestado de médico da empresa (médico do trabalho) ou por ela designado (incluindo aqui a figura do chamado "médico examinador”);
• 4º lugar: atestado de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública;
• 5º lugar (e último): qualquer outro médico que o trabalhador escolher.
Assim, fica respondida a pergunta que origina esse texto: “existe hierarquia entre os atestados médicos?” Resposta: pelo menos para trabalhadores do Direito Privado, e servidores públicos submetidos ao regime da CLT, sim. Para os demais servidores públicos, valerá o que houver sido estabelecido em estatuto/contrato próprio.
Assim, concluímos, por exemplo, que: quando o médico da empresa discorda do médico assistente do empregado (ex.: um ortopedista) com relação ao número de dias de afastamento do trabalho, o médico da empresa age sob a mais perfeita legalidade, por mais polêmico que isso possa parecer aos olhos de muitos. Nessa mesma esteira, temos o Parecer 3.657 / 2009 do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), que assim coloca:
“Ao médico do trabalho, no exercício de suas atividades dentro do âmbito da empresa, é facultada a possibilidade de discordar de atestado médico apresentado pelo trabalhador, assim como estabelecer novo período de afastamento decorrente de sua avaliação médica, sempre assumindo a responsabilidade pelos seus atos.”
Importante salientar que ao discordar do atestado emitido por um profissional assistente do empregado, o médico da empresa assume a responsabilidade pelos dias de afastamento não concedidos, caso haja agravamento da doença aludida.
Ratificamos também, que o médico da empresa só pode discordar de atestados médicos de poder hierárquico inferior. Por exemplo: o médico da empresa poderia até discordar do atestado emitido pelo ortopedista de confiança do empregado, mas não poderia discordar do número de dias de afastamento proposto pelo médico perito do INSS, pois o atestado desse último representa o atestado de maior valor legal, conforme vimos através da hierarquia trazida pela Lei 605 / 1949.
É muito comum a situação onde se observa que o médico da empresa considera o empregado “inapto” ao trabalho, e o médico perito do INSS considera o mesmo empregado “apto”. O que ocorre nesse exemplo, por mais questionável que seja, é perfeitamente legal, calcado da literalidade da Lei 605 / 1949. No caso, a decisão do tempo de afastamento do trabalho determinado pelo médico perito do INSS (primeiro lugar na hierarquia dos atestados), prevalece sobre a mesma decisão tomada pelo médico da empresa (terceiro lugar na hierarquia dos atestados). Na mesma esteira, temos a Lei 11.907 / 2009, que em seu Artigo 30, parágrafo 3, assim coloca:
"Compete privativamente aos ocupantes do cargo de Perito Médico Previdenciário ou de Perito Médico da Previdência Social (...), em especial a: (I) emissão de parecer conclusivo quanto à capacidade laboral para fins previdenciários."
Falamos nesse texto apenas sobre a abordagem legal da hierarquia dos atestados. No entanto, quando o tema é “saúde do trabalhador”, vários outros aspectos estão envolvidos e merecem ser considerados: aspectos sociais, aspectos éticos, aspectos morais, etc. A pauta está aberta, e as opiniões são inúmeras. Ao debate!
Marcos Henrique Mendanha é médico especialista em Medicina do Trabalho e advogado especialista em Direito do Trabalho. É professor de cursos de pós-graduação em Medicina do Trabalho, Perícia Médica e Direito Médico. No Twitter, @marcoshmendanha. Contato: marcos@asmetro.com.br
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